domingo, 30 de dezembro de 2012

LUZ

Nas duas hastes de um hashi se encontra o começo e o fim de tudo

Do jeito japonês de segurar duas hastes de hashi, quando posicionadas na altura do peito, elas ficam em paralelo para nos lembrar da dualidade da vida (material e espiritual). No momento da alimentação é fundamental refletir sobre a subsistência do corpo e da alma, sobre o equilíbrio necessário na manutenção da vida, e com sinceridade, agradecer aos produtores, aos quem abastecem, e em especial, a dedicação de quem cozinha, persistindo na esperança de que cada alimento nos chegue com as graças de um círculo virtuoso, positivo e com energia benéfica dedicada ao serviço em prol do coletivo.

As hastes são de bambu, uma gramínea de crescimento rápido e vigoroso, representando a abundância da natureza, que sempre provê todos os seus filhos. Após o uso vão para o fogão virar a lenha que aquece a alquimia da transformação do alimento e, no final, o pó, do qual viemos e para qual retornaremos um dia para abastecer o ciclo da vida.

As hastes não são limpas e nem guardadas, primeiro para não desperdiçar água pura para limpar as impurezas da matança que só o fogo remove, e segundo para mostrar a ilusão das posses, do ouro e da prata, das infrutíferas ambições, do gasto de tempo, de energia e de preocupações para manter diversas coisas fúteis funcionando, além das convenções sociais confundindo a educação de valores humanos pelas regras de etiqueta.

A convenção japonesa desaconselha que as hastes de hashi sejam colocadas em direção ao rosto, preferindo levantá-las acima da boca para abocanharmos o alimento, obrigando que nos curvemos em reverência ao sagrado alimento, e assim, constantemente, lembrar o bom senso que é evitar a prepotência humana defronte tudo e todos, por mais “inferior” e “domesticado” que possa parecer.

Cada haste é uma reta, portanto, o menor caminho entre dois pontos. O que existe antes do começo e depois do final da haste de bambu é invisível, mas está lá, tais quais as diversas escrituras e ensinamentos de nobreza espiritual estão para conduzir as pessoas no caminho reto e protegido da fé.

Agradeça a todos os obstáculos, por mais desesperadores que possam se apresentar, porque só inserido no caos e convivendo com forças antagônicas é possível sair do torpor da aceitação pacífica, desamarrar-se das correntes da prisão e ter coragem de dizer sim para eliminar tudo o que te prejudica e destrói. Este é o caminho exigido pela evolução pessoal e a propulsão necessária para se elevar sobre as ignorâncias e mediocridades estabelecidas na sociedade.

Viver é constantemente desatar nós e se lançar, vestido de nobres atitudes, às novas perspectivas.

Fernando J.P. Neme